domingo, 24 de outubro de 2010

O SISTEMA
Maria Lucia Victor Barbosa

Tropa de Elite 2 é que deveria concorrer ao Oscar e não a propaganda nazicabocla, Lula, o Filho do Brasil, que nem os devotados militantes petistas aguentaram assistir. Magistral a produção do cineasta José Padilha que ilustra através da ficção a corrupção institucional do Rio de Janeiro.
Em meio, porém, a tantos corruptos, a exceção que exalta a coragem, a honestidade, a integridade de caráter do tenente-coronel Nascimento, atributos raros que introduzem na sordidez asfixiante do Sistema a existência de valores e do heroísmo. Não daquele falso heroísmo que incensa jogadores de futebol ou vítimas de acidentes, mas do verdadeiro sentido do herói capaz de doar-se em prol de uma causa coletiva.
Nascimento volta e meia se refere ao Sistema, algo que dá o que pensar. O termo tem uso preciso em Sociologia e não pretendo aqui esmiuçar os estudos que se fizeram sobre o tema para o texto não ficar cansativo. Apenas esclareço resumidamente que Sistema existe em qualquer grupamento social, sempre composto de um lado por indivíduos singulares e de outro pela complexa rede de relações que caracterizam a convivência recíproca dos indivíduos.
Naturalmente, existem vários tipos de Sistemas e Subsistemas num Sistema global como os Sistemas político, econômico, partidário, etc. No filme aparece um subsistema estadual que engloba do governo estadual à complexa rede de relações onde interagem indivíduos e instituições como a Secretaria de Segurança, a Polícia Militar, a Assembleia Legislativa e grupos marginais com milícias e narcotraficantes. A luta do tenente-coronel é travada contra a corrupção e a ilegalidade reinantes que ele corajosamente enfrenta e denuncia.
Se um filme faz refletir, muito mais devia ser repensado com relação ao Sistema real gerado pelo governo petista. Afinal, é impressionante a quantidade de escândalos de corrupção, de falcatruas, de impunidade que lavram na complexa rede de constelações individuais e institucionais, denunciadas fartamente pela imprensa, mas neutralizadas pelo presidente da República que banaliza crimes e desvios de conduta através de uma retórica onde imperam palavras de baixo calão, piadas de mau gosto e metáforas futebolísticas de cunho populista.
A endeusada figura do líder sindical foi construída pelo grupo de comando do PT, assim como Lula da Silva confeccionou a imagem de Dilma Rousseff. Como disse Hannah Arendt, denunciando a arte de mentir sempre usada em política e cada vez mais aperfeiçoada: “A política é feita em parte, da fabricação de uma imagem e, em parte, da arte de levar a acreditar na realidade dessa imagem”.
A imagem que se construiu do pretenso genial Lula é falsa. Ele na realidade é tosco, por vezes grotesco, faz politicagem, não governa, sua esperteza é exaltada como se fosse dotado de extraordinária inteligência, sendo que a intrínseca malandragem tem o efeito de agradar a seus iguais.
O presidente da República é uma mistura de animador de auditório e cabo-eleitoral. Não lhe perguntem sobre liturgia do cargo porque em sabe o que é isso. E, ao final, descobre-se o segredo da popularidade que as massas lhe conferem: Entre Lula e Tiririca não há diferença.
Essa descrição politicamente incorreta será taxada pelos militantes fundamentalistas do PT de preconceituosa, coisa de “zelite”, como ensinou José Dirceu ao mitológico Lula. Ressalte-se, contudo, em primeiro lugar, que Lula da Silva e os dirigentes governamentais petistas compõem há oito anos a classe dominante onde os poderes político e econômico se somam. Segundo, falta de modos e certos traços de caráter nada têm a ver com origem humilde. Essa interpretação é tão falsa quanto se dizer que a pobreza em si conduz à criminalidade.
Lula da Silva é o poder personificado do Sistema, sua cara, seu símbolo, sua face visível que oculta a sujeira que existe por trás. E é ele quem deve manter o Sistema propício aos companheiros dos mensalões, dos dólares na cueca, dos dossiês, dos sigilos violados, das grandes famílias das Erenices 6% e demais companheiros. Dilma Rousseff é só uma imagem. Não é nada. Apenas servirá ao Sistema.
O grave problema é que a cabo de oito anos de mandato Lula da Silva deixou de lado os gracejos e assumiu sua verdadeira face. No afã de preservar o sistema e sentindo-se acima do bem e do mal se tornou colérico, violento, um figura cheia de ódio que mente descaradamente com a intenção de destruir não o adversário, mas o inimigo. Ele prega o fim da liberdade de imprensa e quer acabar com partidos que o incomodam. Em ataques paranoicos diz que Deus está ao seu serviço para vingá-lo dos parlamentares que não votam como ele quer. Como um Mussolini dos trópicos ele não mede as consequências de suas palavras e de seus atos. Não precisa. Atrás de Lula está o Sistema que o sustenta. Por tudo isso ele tem a tarefa de por lá a insignificante Rousseff. Através dela, ele e o Sistema petista continuam. Isso é tudo que importa. Quem enfrentará o Sistema?
Maria Lucia Victor Barbosa é socióloga.
mlucia@sercomtel.com.br
www.maluvibar.blogspot.com

domingo, 10 de outubro de 2010

CHEGA DE PUNHOS DE RENDA
Maria Lucia Victor Barbosa
07/10/2010

O endeusamento de Marina da Silva tem menos a ver com os méritos da candidata do PV e, sim, com certos fatores que esta conseguiu capitalizar a partir de uma postura crítica.
Entre os fatores ressaltem-se, primeiro, os escândalos que estouraram durante a campanha, sendo menos explosivo o da quebra do sigilo fiscal da filha de José Serra e de outros tucanos e mais evidente para parcela da opinião pública aquele ligado à amiga, braço direito e sucessora de Rousseff na Casa Civil, Erenice Guerra, chamada jocosamente de Erê 6% por conta do hábito de sua grande família instalada no poder achacar pessoas em troca de projetos ligados ao governo.
Segundo, a afronta da candidata de Lula da Silva a católicos e evangélicos, por sua declaração favorável a liberalização do aborto, algo que atualmente ela nega com veementes invocações a Deus e à vida, mas que está incluído em seu programa de governo, assim como o casamento gay foi, sem dúvida, o que causou maiores danos à sua candidatura.
Note-se que funcionaram aspectos morais, sobretudo, de cunho religioso para invalidar o que os institutos de pesquisa apontavam de modo bastante errado: a estrondosa vitória no primeiro turno da afilhada política do presidente da República. E, sem dúvida, a ida de sua sucessora para o segundo turno constituiu uma desagradável surpresa para Lula da Silva e seu círculo de poder ou atual classe dominante. Afinal, a sociedade tinha se mantido indiferente a “mensalões”, “sanguessugas”, dólares na cueca, dossiês e toda a avassaladora corrupção presente no governo do partido que dizia ser o único ético, aquele que viria para mudar a roubalheira governamental oriunda dos tempos coloniais. Ao mesmo tempo, existe uma separação conveniente e artificial entre o PT e Lula da Silva, entre governo e o presidente da República que fica blindado. Assim protegido ele se coloca acima da lei, faz e fala o que bem entende e é aceito e aplaudido. Entretnto, por mais que agora ele apareça gargalhando e fazendo piadas como é de seu hábito, no fundo deve ter sentido pela primeira vez a estocada da sociedade que não consagrou sua ungida no primeiro turno. Lula da Silva deve estar desconfiado que não é mais o cara.
Quanto ao assunto da quebra de sigilos, nepotismo e extorsões da grande família da ex-ministra da Casa Civil, Ereneci Guerra, Lula da Silva, que esteve metamorfoseado em cabo eleitoral de sua criação política, preferiu abusar do gestual em palanques. Parecendo transtornado, tomado de ira incontrolável, entre estertores e esgares urrou para quem quisesse ouvir e ver via TV, que os feitos e responsabilidades de violadores petistas de sigilos ou de sua importante ex-ministra não eram coisa real, mas mentira da imprensa propensa a prejudica-lo e à sua candidata. Fazendo coro com José Dirceu e Franklin Martins, o presidente de olhos injetados, rosto de cor violácea, fala raivosa lembrou seu querido companheiro Hugo Chávez, que também não suporta a mídia e tem agido de modo truculento e ditatorial contra o que denomina de excesso de liberdade de pensamento.
O presidente da República diz voltará neste segundo turno a representar o Lulinha paz e amor. Antes, furioso, apresentou ao Brasil sua porção de Mussolini dos trópicos, no que foi secundado por seu partido e pelos aguerridos militantes que, numa inversão cínica acusaram os que defendem a liberdade de expressão, de fascistas.
Não se pode negar que o crescimento de Marina ajudou Serra a passar para o segundo turno. Os que não simpatizavam com o artificialismo da candidata petista ou a pasmaceira do tucano optaram pela onda verde. Não propriamente como defensores da ecologia, mas por causa da firmeza de Marina ao criticar a esbórnia reinante que, se fosse promovida pelo candidato do PSDB acarretaria a imediata impugnação de sua candidatura.
E Serra, o que fez no primeiro turno? Muitos erros ligados à morosidade e à indecisão. Pior. Enquanto o PT que costuma se estraçalhar entre suas facções, se une durante as campanhas como se fosse um só corpo, exalta seu já exaltado Lula da Silva, revida com furor qualquer ataque. Já os tucanos são extremamente individualistas, acomodados, indecisos, lentos e nutrem por Lula da Silva um inequívoco encantamento que os faz a ele submissos, sem reação diante das pancadas petistas que levaram durante oito anos, sem se defender. Desse modo, passam a imagem de medrosos para não dizer coisa pior. Escondem Fernando Henrique e seu governo que foi macaqueado pelo PT. Receiam apontar as falcatruas governistas.
Mas agora é chegada a hora de Serra recolher os punhos de renda e trocá-los pela crítica que pode ser serena e ao mesmo tempo contundente. Não adianta repetir o que diz Rousseff sobre Saúde, Educação, erradicação da miséria. Estes temas são tão velhos, batidos e não solucionados quanto nossa história e devem fazer parte de todo programa de governo sem maiores alardes Que José Serra esqueça os conselhos de seu marqueteiro e fale sobre a corrosão de nossos valores, a imoralidade reinante nos Poderes constituídos, a violência advinda do narcotráfico, a violência no campo gerada pelo MST, a corrupção galopante do PT no poder. Que ele não tenha medo de mostrar a empulhação presidencial. Que chame para seu lado FHC para que este tenha a chance de mostrar o que fez pelo Brasil, sua obra chamada de herança maldita, mas copiada pelos mandarins petistas. E que ao lado de Serra se posicionem seus aliados e os governadores eleitos pelo PSDB que, durante a campanha ocultaram Serra, com exceção do governador eleito por São Paulo, Geraldo Alckimin.
Se assim não for, correm o risco os tucanos de parecerem covardes. E o Brasil não precisa de covardes, de boquirrotos palanqueiros, de ditadores enrustidos, de gente despreparada para o poder, mas de estadistas. A hora é agora, chega de punhos de renda. E que José Serra não se omita, pois sua omissão será paga em gerações.
Maria Lucia Victor Barbosa é socióloga
mlucia@sercomtel.com.br
www.maluvibar,blogspot.com