VIEJOS TIEMPOS
Maria Lucia Victor Barbosa
22/04/2012
Em que pese os sinais de modernização havidos em
alguns países da América Latina, especialmente a partir dos anos 90, as marcas
da colonização que plasmaram a mentalidade dos seus povos nunca deixaram de
existir. São mantidos ou emergem como nos viejos tiempos: instabilidade
política, crises econômicas, incompetência governamental, corrupção, populismo,
nepotismo, patrimonialismo, autoritarismo, impunidade, hipertrofia do Poder
Executivo, ausência de cultura cívica.
Além disto, como afirmei em um dos meus livros,
América Latina, em busca do paraíso perdido, latino-americanos possuem
uma estranha mescla de altivez e sentimento de inferioridade. Para se livrarem
da síndrome do fracasso, das mazelas, das fraquezas, cujas raízes se prendem ao
passado colonial, descarregam sua frustração em possíveis culpados,
especialmente, nos Estados Unidos por conta do insuportável progresso daquele
país. Latino-americanos só se esquecem de perguntar o que fizeram a si
mesmos.
O recente ato de populismo desvairado e nacionalismo
irracional da presidente da Argentina, Cristina Kirchner, ao expropriar a YPF,
maior empresa petrolífera do país adquirida pela Repsol espanhola em 1999,
relembra viejos tiempos da era Perón.
Adorado até hoje por muitos argentinos, cultuado
como uma espécie de deus, admirado como herói, Juan Domingo Perón tem também os
que o relembram como déspota odiado, causa de todos os males da Argentina. De
todo modo, cabe acentuar alguns elementos marcantes do governo peronista, os
quais contribuíram de forma decisiva para o declínio do país que chegou a ser
chamado de “Colosso do Sul”. Derivados de toda uma evolução histórica, social e
politica esses elementos encontraram em Perón as condições ideais de expansão e
foram justamente eles que Cristina Kirchner ressuscitou: a falsa democracia, o
nacionalismo xenófobo, a demagogia exacerbada. Um filme que a Argentina já viu
várias vezes e que nunca teve um final feliz.
Recentemente, com o mesmo intuito de desviar as
atenções dos argentinos da situação econômica, na qual avulta uma inflação da
ordem de 25% e a fuga de bilhões, sendo que neste ano já deixaram o país US$
22,5 bilhões, a presidente Kirchner voltou aos viejos tiempos do
General Leopoldo Galtieri e simulou desencadear outra guerra das Malvinas.
Naquela aventura ao mesmo tempo grotesca e trágica,
o General Galtieri chegou a afirmar: “Não cremos que a Grã-Bretanha se mobilize
pelas Malvinas”. Ao contrário, na Inglaterra houve imediato sentimento de defesa
dos kelpers que, segundo os britânicos tinham o direito de decidir seu
futuro e se livrar de um despotismo estrangeiro arbitrário e brutal.
Na guerra que durou setenta e dois dias, levaram a
pior os mal preparados recrutas argentinos diante de um pequeno grupo de tropas
de elite enviado pelos britânicos às ilhas Falklands que incluía marines,
paraquedistas e mercenários ghurkas. O fracasso fez a frustração
popular se voltar contra o governo Galtieri e, ao contrário, deu ao governo de
Margaret Thatcher estrondosa vitória eleitoral. Possivelmente essas recordações
fizeram Kirchner desistir da estapafúrdia ideia de invadir as Falklands
passando, então, a fabricar algo que contivesse também forte apelo nacionalista:
a expropriação que só faltou ter o mote: “o petróleo é nosso”.
Enquanto nos
Estados Unidos e na Europa, a expropriação da YPF foi duramente criticada, a
presidente Dilma e o ministro de Minas e Energia Edison Lobão, seguindo a arenga
do ex-presidente Lula da Silva, correram para acudir o governo argentino dizendo
que o ato do país vizinho é uma questão de soberania. Esqueceram que romper
tratados não é próprio da soberania, mas da selvageria, pois não é civilizado
romper acordos internacionais.
O ministro Lobão, disse crer que a Petrobrás não
será expropriada na Argentina. Já o foi, na província de Neuquén, em princípio
de abril. Também esqueceu ou ignora que a presidente Kirchner tem mantidos
congelados os preços dos combustíveis nos postos da Petrobrás, apesar da
inflação, talvez, um detalhe menor porque o Brasil está fazendo o mesmo.
Como era de se
esperar, na medida em que o governo argentino não tem condição de bancar os
investimentos que a Repsol fazia, a presidente Kirchner enviou o ministro de
Planejamento da Argentina, Julio de Vido, para conversar com nosso ministro de
Minas e Energia. O primeiro propôs o aumento da participação da Petrobrás de 8%
para 15% do mercado de produção, processamento de petróleo e distribuição. Lobão
respondeu que fará de tudo para ajudar o país vizinho. Já vimos um filme
parecido na Bolívia. São viejos tiempos que sempre voltam, aqui e
em toda América Latina.
Maria Lucia Victor Barbosa é socióloga.
Excelente artigo! Obrigado!
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