ESPELHOS PARTIDOS
Maria
Lucia Victor Barbosa
23/03/2013
“Somos
nosso passado. Somos este quimérico museu de formas inconstantes; este
amontoado de espelhos partidos”.
Jorge
Luís Borges
Para
entender a América Latina é preciso voltar no tempo como fiz em um dos meus
livros, “América Latina – em busca do paraíso”. Constatar, tomando emprestada a
expressão do genial pensador espanhol, José Ortega y Gasset, nossa “embriogenia
defeituosa”. E, apesar das diferenças entre a colônia portuguesa e as colônias
espanholas entender que origens coloniais fizeram igualmente de nós sociedades
invertebradas.
Afinal não tivemos como na “Espanha
invertebrada” de Gasset “a comunidade de propósitos” que faz com que grupos
integrantes “convivam não por estar juntos, mas sim por fazer algo juntos”. Ao
mesmo tempo, nossas sociedades desiguais, o isolamento entre as camadas
sociais, a falta de “minorias seletas” que comandassem o processo
emancipatório, a inexistência do espírito associativo substituído pela vivência
do pequeno mundo familiar ou clânico gerarão o desequilíbrio estrutural cujas
manifestações mais graves até hoje sentidas são: o atraso econômico, a
mentalidade do atraso, o autoritarismo, o paternalismo, o clientelismo, o
nepotismo, o patrimonialismo e a corrupção endêmica.
No
nosso subdesenvolvimento político e econômico somos envolvidos por um
sentimento estranho, a um tempo de altivez e de inferioridade, sendo que
preferimos descarregar nossa frustração em possíveis culpados utilizando,
inclusive, a equivocada fórmula que diz que uns são pobres porque outros são ricos.
Desse modo, culpamos especialmente os Estados Unidos por nossas mazelas e
fraquezas. Só nos esquecemos de perguntar o que fizemos a nós mesmos.
Fatos
recentes ocorridos em nosso país e na América Latina demonstram que as
características acima apontadas permanecem, pois fazem parte de uma cultura
plasmada ao longo dos séculos. E aqui me refiro à cultura no sentido do
complexo de valores, atitudes e comportamentos.
Um
desses fatos foi a visita da corajosa dissidente cubana, Yoani Sanchez, que
enfrenta a tirania dos irmãos Castro pedindo liberdade e democracia para seu
país. Isto tem um preço na Cuba totalitária e Yoani o tem pagado com prisão e
tortura. Entretanto, suas armas não são as armas assassinas de Fidel Castro,
mas palavras postadas no seu blog.
Pois
bem, a mando do embaixador de Cuba, Carlos Zamora Rodriguez, que contou com o
apoio do governo brasileiro, calunias e difamações foram divulgadas contra a
moça pela REDEPT13. Note-se que hipocritamente petistas costumam falar em
direitos humanos e democracia. Ao mesmo tempo, Yoani foi perseguida por
grupelhos agressivos de perfeitos idiotas brasileiros. Eles foram uma espécie
de milícia fascista à moda Mussolini e Chávez, e exerceram feroz intimidação
que associa truculência, ignorância, fanatismo.
Os
jovens que ajudaram fazer do Brasil um satélite de Cuba são portadores da mesma
idiotice analisada por Plinio Apuleyo de Mendoza, Carlos Alberto Montaner e
Álvaro Vargas Llosa no “Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano.” Essa
“doença”, segundo Mario Vargas Llosa, que fez a apresentação do livro, não é a
congênita, mas tem outra índole: “É postiça, deliberada e eleita, se adota
conscientemente por preguiça intelectual, modorra ética e oportunismo civil”.
“É ideológica e política, mas acima de tudo, frívola, pois revela a abdicação
da faculdade de pensar por conta própria”.
Outro
fato marcante na América Latina foi a morte de Hugo Chávez, típico tiranete
populista latino-americano que levou algum benefício aos pobres através de
caridades oficiais, mas destruiu a economia venezuelana. Chávez, ao se
perpetuar no poder foi uma fraude democrática. Ele subjugou o Legislativo, o Judiciário
e o Exército, impôs a censura dos meios de comunicação, perseguiu seus opositores
de maneira implacável. Até sua morte, que não se sabe quando ocorreu realmente
foi envolvida numa rocambolesca e misteriosa farsa a cargo do sucessor por
Chávez ungido para dar continuidade ao governo, Nicolás Maduro. Este mentiu o
que pode, inventou lorotas, falou em mumificação do chefe e ocupou o cargo de
presidente inconstitucionalmente. Agora está em campanha e certamente vai se
eleger para que Chávez continue a governar do além.
O
PT deve ter uma ponta de inveja do companheiro Chávez porque não conseguiu
alcançar a radicalização venezuelana. Porém, está a caminho. Dilma, a sucessora
ungida por Lula é presidente e candidata. Portanto, ela tem a caneta e os
recursos materiais das bondades e o tempo que desejar na mídia. Um poder que os
demais candidatos não dispõem o que dificulta enfrentá-la.
Ah,
sim, e pela primeira vez foi eleito um Papa latino-americano. Dilma disse que
ele é normal (?), e que Deus é brasileiro. Desconfio que seja argentino, pois
elegeu um Papa da Argentina. Talvez, o diabo seja brasileiro, pois a presidente
em campanha jurou que vai fazer o diabo.
E
assim vamos nós, sociedades em busca de si mesmas, tão parecidas entre si por
serem os fragmentos de um espelho partido.
Maria
Lucia Victor Barbosa é socióloga.
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